Veja bem, Os canabinoides são compostos orgânicos únicos — pequenas arquiteturas de carbono, hidrogênio e oxigênio que formam anéis aromáticos e longas caudas carbônicas que tem a rara habilidade de atravessar membranas celulares e dialogar com o sistema endocanabinoide, encontradas exclusivamente na planta da cannabis.
Até o fim dos anos 2000, mais de oitenta fitocanabinoides (originados na planta) distintos já haviam sido identificados em Cannabis sativa. Em meados de 2018, se indicavam por volta de 120 fitocanabinoides identificados naturalmente na planta (FORDJOUR et al., 2023).
Com base nisso, é sensato deduzir que os próximos anos e décadas ainda verão dezenas, ou centenas, de “novos” canabinoides descobertos.
E daí?
Para além das virtudes deste cannabinoide específico, sabe porque essa descoberta traz coisas novas para a mesa? Aqui vão 10 razões pra prestar atenção:
A ciência cannabinoide é um catálogo em renovação constante
Mesmo depois de mais de 150 canabinoides conhecidos, a planta continua revelando novos compostos. Isso confirma que a cannabis é um sistema químico dinâmico, e não um catálogo fechado de moléculas.
Cada novo composto muda o mapa: abre possibilidades terapêuticas e desafia classificações antigas.
Descoberta não é nascimento
O fato da existência do cannabizetol ser nova para nós, não faz com que sua presença seja nova. Ele já estava presente, influenciando os efeitos sentidos. Agora cabe elucidar essa influência.
O novo cannabinoide é produto da interação de cannabinoides, é um resultado simbiótico
Os pesquisadores encontraram o CBGD primeiro no laboratório, ao tentar reagir CBG com formaldeído, e só depois confirmaram que ele também existia na planta. Isso ensina algo essencial:
“Muitos dos chamados ‘canabinoides menores’ não são produtos biogênicos da planta, mas artefatos formados durante os tratamentos que envolvem a presença de calor, luz, oxigênio, etc.” (POZZI et al., 2025, p. 2).
Essa ideia ecoa o que muitos produtores artesanais percebem empiricamente: a maneira como se extrai, filtra, aquece ou armazena o óleo altera o espectro de compostos.
O estudo reforça, com base científica, que condições físico-químicas do processo (temperatura, oxigênio, solventes) podem gerar novas substâncias bioativas, inclusive mais eficazes que os compostos originais.
No caso, isso tem enorme implicação para quem trabalha com extratos artesanais complexos, que preservam a interação natural entre compostos — aquilo que a ciência industrial farmacêutica muitas vezes simplifica ou perde.
Significa que a maneira como se extrai, aquece, seca ou armazena o extrato pode criar novas substâncias, algumas com potência maior que as originais. Ou seja: a alquimia herbalista é também um laboratório químico, que começa com as mãos sujas de terra.
Reforça o valor dos extratos complexos
O novo canabinoide mostrou atividade anti-inflamatória até quatro vezes maior que o CBG isolado.
Isso comprova que as interações entre compostos (efeito entourage) geram resultados mais potentes e sutis do que moléculas isoladas, pois este composto é resultado específico dessa interação.
Na prática, confirma o que os produtores artesanais observam empiricamente: a força do remédio está na relação entre as partes, não só na pureza de um componente.
Revela a consistência como ferramenta de liberdade
A equipe só conseguiu confirmar a descoberta porque tinha padrões analíticos e metodologia reprodutível.
No mundo artesanal e profissional, isso se traduz em registrar temperaturas, tempos, solventes, cores, aromas e densidades. Perceber as variações sutis com o repertório científico e sensorial como instrumental para potencialização O desafio que separa um leigo amador de um herbalista profissional.
Padronizar não é burocratizar: é criar linguagem comum entre quem pesquisa, extrai e utiliza. É ter consistência e estabilidade para que haja previsibilidade de efeitos.
Redefine o conceito de “natural”
Muitos “novos cannabinoides” não são formados pela planta diretamente, mas em sua interação com o ambiente ou com o processo humano.
Isso questiona a ideia de que só o que “nasce da planta” é natural — o processo também faz parte da natureza.
A cannabis viva é uma entidade química em constante transformação, e quem manipula está co-criando com ela.
Inspira novas perguntas, não só novos produtos
Quantos compostos surgem durante uma extração?
O que muda quando o extrato envelhece?
Há “canabizetóis” escondidos nos óleos produzidos no Brasil?
Óleos envelhecidos ou “amadurecidos” podem ser mais eficazes que frescos?
E se o futuro da medicina da cannabis não estiver só em novos isolados, mas em novas combinações vivas?
O descobrimento científico valida o que o saber popular já intuía
O herbalista sempre soube empiricamente que “o extrato muda”, “amadurece”, “fica mais forte com o tempo”.
Agora, a ciência confirma: essas transformações têm base química mensurável.
A observação empírica ganha nome, fórmula e legitimidade.
Será possível entender minuciosamente o funcionamento de cada molécula?
Enquanto a complexidade de cada molécula agindo por separado pode levar décadas de estudos intensivos, o estudo cartesiano exaustivo das suas interações pode ser ainda muito mais exaustivo, levando ao impossível a partir das centenas de interaçõe que uma só molécula pode ter. Imagina compreender mais de 100 dessas moléculas em suas interações complexas, como a planta produz naturalmente.
Isso nos conduz a pensar a pesquisa da cannabis como algo para além do estudo cartesiano linear de cada molécula, que lance mão de outras metodologias menos ortodoxas que as clássicas.
O cannabizetol é mais que um novo canabinoide: é um símbolo da complexidade ainda não mapeada da cannabis.
Estudar cada molécula é importante, mas a relação entre as moléculas parece ser ainda mais significativo, especialmente para quem trabalha com a planta em seu espectro terapêutico completo.
O estudo mostra que a ciência acadêmica e a produção artesanal estão olhando o mesmo fenômeno por lentes diferentes:
- a primeira busca isolar e entender;
- a segunda, compreender e integrar.
Ambas convergem em uma verdade central: a potência terapêutica da planta depende de como a tratamos, combinamos e observamos suas transformações.
Referências:
POZZI, Luca et al. Cannabizetol, a Novel Cannabinoid: Chemical Synthesis, Anti-inflammatory Activity and Extraction from Cannabis sativa L. Journal of Natural Products, Washington, DC: American Chemical Society / American Society of Pharmacognosy, v. 88, n. 2, p. 1725–1748, 2025. DOI: 10.1021/acs.jnatprod.5c00826
FORDJOUR, Eric; MANFUL, Charles F.; SEY, Albert A.; JAVED, Rabia; PHAM, Thu Huong; THOMAS, Raymond; CHEEMA, Mumtaz. Cannabis: a multifaceted plant with endless potentials. Frontiers in Pharmacology, v. 14, 2023. DOI: 10.3389/fphar.2023.1200269. Disponível em: https://www.frontiersin.org/journals/pharmacology/articles/10.3389/fphar.2023.1200269. Acesso em: 13 out. 2025. ISSN 1663-9812.
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