A campanha “Setembro Amarelo” é um convite para pensar na promoção de saúde mental e prevenção do suicídio, questões que estão intimamente ligadas à construção de políticas públicas efetivas.
Apesar de ser uma campanha com um objetivo positivo, o que vemos ao longo dos anos é uma banalização do entendimento do que é a problemática do suicídio e até o aumento do número de casos durante o mês de setembro. (Mann, Maia & Sá, 2024).
Isso nos alerta para a necessidade de repensar não apenas as campanhas, mas também as estratégias de comunicação e cuidado, garantindo que não se tornem superficiais ou meramente simbólicas.
Pensando nisso, não só nós, como também outras iniciativas que pesquisam, estudam e/ou produzem conteúdo de qualidade sobre saúde mental, vêm levantando questões importantes e críticas construtivas à campanha do Setembro Amarelo.
Como falar em saúde mental e preservação da vida sem falar do combate à fome, desigualdade social, oportunidades de emprego, renda e possibilidades de cuidado integral?
Como falar em saúde mental sem considerar a importância do SUS, dos CAPS e do cuidado em liberdade e no território?
E como falar em prevenção do suicídio quando se segue sustentando uma gu3rr4 que m4t4 diariamente, sem considerar que muitas pessoas vivem diariamente em zonas de conflito que são produtos disso? A guerra às drogas produz exclusão, racismo e sofrimento psíquico, empurrando pessoas para a margem e negando possibilidades. A conta não fecha.
Falar sobre suicídio e preveni-lo são essenciais, mas não apenas em setembro. Precisamos estar atentos a essas questões para a promoção de um cuidado mais amplo e efetivo. Isso significa reconhecer que o sofrimento não nasce no vazio individual, mas é atravessado por políticas que produzem violência e desesperança.
É primordial pensar como a política de drogas atual intensifica o sofrimento emocional de quem usa substâncias e agir na contramão disso. Dois pontos são cruciais nesse cenário: a falta de acesso à informação educativa e a repressão policial.
Sem informação segura, usuários/as ficam expostos/as a riscos que poderiam ser evitados com orientações simples, enquanto educar previne incidentes em vários níveis de gravidade, como intoxicação por misturas perigosas e overdose. A educação em saúde, nesse sentido, é uma ferramenta de cuidado e também de valorização da vida, porque reconhece a autonomia das pessoas e fortalece sua capacidade de escolha.
Já a repressão policial gera insegurança física e psicológica constante, principalmente nas populações mais vulneráveis (pessoas pobres, pretas e LGBTTQIAPN+). Pensando no uso de substâncias e na prevenção, ações violentas da polícia associadas ao estigma com os usuários podem influenciar na busca de acesso à saúde, afastando usuários, que evitam procurar serviços de cuidado.
A redução de danos aponta outro caminho: o do cuidado, da escuta, da promoção de autonomia, da invenção de formas de seguir existindo apesar das dores. Falar de vida, no Setembro Amarelo, é também dizer que nenhuma vida é descartável e que saúde mental não combina com criminalização.
Pensar o Setembro Amarelo pela perspectiva da Redução de Danos é trazer mais profundidade ao debate, não minimizar as diferentes formas de sofrimento e ampliar as formas de cuidado com empoderamento, consciência e autonomia.
Quando existe um ‘setembro amarelo’ sem redução de danos, o que existe, na verdade, é só marketing. Fiquemos vigilantes!
Referência Bibliográfica:
MANN, E. H. A.; MAIA, S. A.; SÁ, L. F. Análise da eficácia das companhas de prevenção ao suicídio: impacto do “setembro amarelo” no Brasil. Brazilian Journal of Health Review, [S. l.], v. 7, n. 5, p. e73540, 2024. DOI: 10.34119/bjhrv7n5-430. Disponível em: https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BJHR/article/view/73540. Acesso em: 16 sep. 2025.
Autores
Alexandre Monteiro de Souza – CRP 16/7696 @dichavandoard
Ana Clara Ulian Ivok – CRP 06/147254 @psi.anaclaraivok
Jefferson de Oliveira Silva – CRP 15/6091 @psi.jeffersonoliveira
Kássia Gonzáles Tosta – CRP-PR 08/31419 @kassiagonzalespsi
Joana Cardoso Lopes Venâncio – CRP 04/61306 @psijoanalopes