Union Berlin, maconha e o tabu do patrocínio

Por que aceitamos álcool e rejeitamos a planta?
Union Berlin

O anúncio do 1. FC Union Berlin, clube da Bundesliga, de que terá a empresa de cannabis medicinal avaay Medical como patrocinadora principal é mais do que uma jogada de marketing: é um ato histórico. Pela primeira vez, um time da elite do futebol europeu estampa em sua camisa uma marca ligada à cannabis.

E isso expõe uma contradição que há décadas se naturalizou no esporte: por que as arquibancadas e transmissões foram inundadas por logotipos de cerveja, vodka e uísque — substâncias que causam milhões de mortes todos os anos —, enquanto o simples nome “maconha” ou “cannabis” ainda soa como tabu?

O contraste é gritante. Durante anos, marcas de cerveja, destilados e até casas noturnas regadas a álcool se associaram ao futebol sem grandes questionamentos. E, no entanto, o impacto social dessas parcerias é evidente: a naturalização do consumo de álcool entre jovens torcedores e atletas amadores.

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Foto: Reprodução

O peso da tradição e da hipocrisia


O futebol sempre foi um campo fértil para a normalização do consumo de álcool. Marcas como Heineken, Budweiser e Carlsberg patrocinaram Copas do Mundo, Ligas dos Campeões e inúmeros clubes. Campanhas milionárias transformaram cerveja em sinônimo de torcida, pertencimento e celebração — a ponto de ser impensável assistir a uma transmissão esportiva sem algum comercial exaltando a bebida.

Mas há um custo. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o álcool está diretamente associado a 3 milhões de mortes por ano, além de doenças crônicas, acidentes de trânsito e violência doméstica. Mesmo assim, sua presença no esporte nunca foi seriamente questionada em termos de influência sobre os jovens ou sobre o “bom exemplo” que clubes deveriam dar.

Já a maconha que, em contextos medicinais, mostra potencial para tratar dores crônicas, ansiedade, epilepsia e até reduzir dependência de opioides, foi sistematicamente afastada do esporte, tratada como ameaça moral.

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Foto: Reprodução/FC Union Berlin


A coragem do Union Berlin


Nesse cenário, o Union Berlin rompe um muro. Não é apenas o primeiro clube alemão a assumir tal patrocínio, é um dos primeiros clubes do mundo a oferecer ao público a possibilidade de associar maconha não ao estigma criminal, mas ao campo da saúde, da ciência e do cuidado.

A parceria com a avaay Medical prevê não apenas exposição de marca, mas também ações educativas, campanhas de informação e debates públicos. Trata-se de um modelo de patrocínio que pode ensinar algo a todo o ecossistema do esporte: a maconha pode — e deve — ser tratada como tema de saúde pública e inovação, não como tabu.

Diante desses dados, o patrocínio do Union Berlin rompe com um paradigma: normaliza a maconha num espaço que, historicamente, acolheu o álcool como parte do espetáculo, ignorando seus custos sociais. A questão não é apenas publicitária, mas cultural.

Quando uma marca de cerveja estampa a camisa de um clube, transmite aos jovens a ideia de que beber é parte da identidade esportiva. Quando uma empresa de maconha entra nesse território, surge a oportunidade de propor outro imaginário, ligado ao consumo consciente.


O futuro em jogo


O movimento ainda é tímido, mas significativo. Se a maconha já está presente em farmácias, clínicas e até legislações de diversos países, por que não poderia estar nas camisas e campanhas do futebol?

A coragem do Union Berlin pode abrir espaço para que outros clubes, ligas e federações revejam esse duplo padrão e reconheçam que a maconha mais ajuda no esporte que atrapalha, tanto em cifras como em saúde dos próprios atletas.

Talvez, no futuro, veremos mais clubes substituindo o brinde alcoólico por um baseado de escolhas conscientes. Mas, por que demoramos tanto para deixar que o futebol refletisse a realidade do nosso tempo?

Marcel Lyra


maconhometro
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